quarta-feira, 13 de julho de 2016

FIM

No domingo passado publiquei o post que representa o livro de número 300 e hoje, logo depois do pôr do sol, o deixei no banco do calçadão que fica quase em frente ao Farol da Barra. Assim, após abandonar trezentos livros que faziam parte da minha biblioteca, e da minha vida, encerro o blog.

Dou por cumprida a missão que estabeleci em abril do ano de 2010 e parto para uma nova forma de leitura. Quero voltar a fazê-lo despreocupadamente e no meu ritmo. Aproveitar esse tempo de vida que me resta para degustar as palavras escritas e não mais sorvê-las freneticamente porque tenho que cumprir a meta de um livro por semana.

Não pretendo apagar o blog da rede. Vou deixa-lo pairando nessa nuvem que é a Internet para visita-lo quando sentir saudade, ou até escrever um novo post quando achar que um bom livro merece meu humilde comentário. Também deixarei ativos o e-mail e o campo dos comentários para responder aos que escreverem.


Aos leitores e amigos meu sincero agradecimento.

Até um dia.

domingo, 10 de julho de 2016

EM BUSCA DE UM NOVO AMANHÃ


Sidney Sheldon (1917-2007) foi ousado quando escreveu Lembranças da Meia Noite – 1990, a continuação de seu maior sucesso O Outro Lado da Meia Noite – 1973, com o inegável estilo que o consagrou. Outra ousadia desse mestre foi desenvolver uma história para um personagem coadjuvante de outra obra. Foi o caso de Dana Evans, ela aparecia numa trama paralela em O Plano Perfeito – 1997 e ganhou o protagonismo no livro O Céu Está Caindo – 2000. Tilly Bagshawe continua escrevendo na sombra do mestre já falecido com autorização da família que detém os direitos da obra. Já publicou livros cujo enredo foi desenvolvido por Sheldon e que não houve tempo para terminar, assim informa a assessoria de imprensa. Prova disso é o ótimo A Senhora do Jogo – 2009, que é a continuação de O Reverso da Medalha – 1982, outro livro memorável.

Em 1985 Sheldon publicou Se Houver Amanhã, um livro que alcançaria enorme sucesso de crítica e público e sua heroína Tracy Whitney é, na minha mais modesta opinião, a mais carismática das personagens do autor. Sofremos com seus percalços e vibramos com suas vitórias, uma protagonista fora do padrão para a época. Todos ficam apaixonados por Tracy e torcem para que seus roubos fiquem impunes e ela tenha um final feliz ao lado de Jeff Stevens, seu grande amor.

Eu sou um dos milhões de fãs de Tracy e quase enfartei quando vi na livraria o título “Em Busca de Um Novo Amanhã”, em cuja capa a esperta editora ainda achou espaço para colocar a seguinte frase: “A heroína de Se Houver Amanhã, Tracy Whitney, está de volta em uma sequência de tirar o fôlego.” É óbvio que apanhei um exemplar e corri para o caixa. Tracy e Jeff se casam no Brasil e, aposentados dos crimes, vão morar em Londres. Ele vai trabalhar no museu e ela aguarda ansiosamente um filho para completar sua nova vida. O filho não vem e uma estagiária do museu estraga seu casamento. Tracy some no mundo disposta a esquecer Jeff. Dez anos se passam. Roubos de joias e obras de arte estão acontecendo no ‘estilo’ Tracy e uma coincidência levanta a suspeita de que ela esteja envolvida com os assassinatos de mulheres cujos cadáveres são encontrados ao lado de textos bíblicos. Jean Rizzo, detetive da Interpol, começa sua investigação que vai colocar Tracy e Jeff frente a frente novamente.

Mesmo com todos os elementos de um livro que faz jus a grife Sidney Sheldon: fortuna, poder, intriga, assassinatos, hotéis de luxo, desaparecimentos, obras de arte, vinganças, Tilly Bagshawe não consegue ser tão genial como seu mestre. Há fragilidades desnecessárias na trama. Talvez lhe falte a possibilidade de seguir o próprio rumo e não ficar à mercê de pensar como Sheldon escreveria. Deve ser muito difícil ver a capa do livro que você escreveu sozinho e constatar que seu nome aparece abaixo de outro autor mais famoso e ainda escrito numa fonte menor. Basta ver a fotografia do livro que está no post.

PS: Este é o livro de número 300 que vou abandonar. Para mim uma marca significativa. São 300 livros retirados da minha biblioteca e estou muito feliz em dividi-la com vocês.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Banco calçadão quase em frente ao Farol da Barra
Data: 13/07/2016

domingo, 3 de julho de 2016

O MENINO DO DEDO VERDE


Tinha 14 anos e me considerei velho demais para aquele livro de capa verde, estava lendo por causa de um trabalho escolar e não percebi de imediato a grandeza da obra que tinha em mãos. Lembro que houve um sorteio entre as equipes de trabalho para os livros que a professora selecionou e na minha hora recebi diretamente O Menino do Dedo Verde porque ela sabia que eu já havia lido Meu Pé de Laranja Lima, Caçadas de Pedrinho, O Pequeno Príncipe, dentre outros. Não lembro como ficou o trabalho da escola, mas a história de Tistu voltaria a aparecer na minha vida.

Anos depois estava na casa de meus pais arrumando os livros que levaria para meu primeiro apartamento quando achei o exemplar do mais famoso livro de Maurice Druon (1918-2009). Lembro que pensei em reler, mas não o fiz. Quando mudei para São Paulo muitos livros ficaram em caixas durante meses até que as estantes do apartamento ficassem prontas e é claro que reencontrei o livro nas arrumações. Nem precisei reler todo, bastou folhear algumas páginas e me ater aos grifos feitos para o trabalho da escola para que a história voltasse à memória, exatamente como aconteceu agora antes de escrever esse post.

“- Descobri uma coisa extraordinária – disse Tistu em voz baixa. – As flores não deixam o mal ir adiante.”

Para quem ainda não conhece, Tistu é um garoto que não conseguia frequentar a escola formal e os pais resolveram que ele teria professores particulares para a escola da vida. Quando Tistu conhece Bigode, o jardineiro, descobre que possui um dedo verde que tem o dom de fazer crescer plantas e flores quando toca em algum lugar. Esse talento secreto de Tistu tocaria diretamente a alma do jardineiro. O menino começa então a desbravar o mundo questionando padrões estabelecidos da forma como só uma criança é capaz, com o coração aberto e o pensamento simplista frente ao que vê e o que sente.

“A prisão é dessas coisas que a gente encara tranquilamente para as pessoas que não conhecemos. Mas logo que se trate de um menino de quem a gente gosta, é tudo diferente.”

Não estou triste por abandonar minha edição de 1976 cheia de trechos grifados, acredito sinceramente que o livro será achado por alguém que aproveitará o que já está marcado e fará novas inserções. É um livro de criança que todo adulto deveria ler para não esquecer que já foi pequeno um dia.

“Pois fiquem sabendo que nunca conhecemos ninguém completamente. Nossos melhores amigos reservam sempre surpresas.”

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Lounge Sala DeLux - Shopping Barra
Data: 12/07/2016

domingo, 26 de junho de 2016

MENSAGEM


Quando comecei a folhear o livro que pretendo abandonar fui tomado por um saudosismo que nem sabia que existia dentro de mim. Senti uma saudade imensa de São Paulo, cidade que morei por treze anos e onde fui muito feliz, mas também muito infeliz. São Paulo tem esse efeito dubio em mim. A felicidade em ter por perto todos os teatros, cinemas, mostras de filmes que não entram em circuito normal, galerias, museus, exposições que não viajam para outras cidades, livrarias, sebos e bancas de revistas com publicações do mundo inteiro. A infelicidade estava no fato de ter tudo isso à mão e usufruir muito pouco porque trabalhava de forma insana às vezes quinze horas por dia. Ao tocar o livro lembrei exatamente do dia e local onde comprei, e também o quanto foi difícil sua leitura.

Mensagem foi editado pela primeira vez em 1934 e seu autor, Fernando Pessoa (1888-1935), faleceu nove meses depois da publicação. Consta que é sua única obra escrita em português e também a que mais enaltece Portugal. Dividida em três partes, Brasão, a primeira, é subdividida em: Os Campos, Os Castelos, As Quintas, A Coroa e O Timbre. Depois vem a segunda parte chamada de Mar Português, a que mais gosto, e por fim O Encoberto, que também possui subdivisões cujos títulos são: Os Símbolos, Os Avisos e Os Tempos. Não é uma obra de fácil leitura, eu precisei consultar um dicionário luso-brasileiro em determinados momentos para entender alguns simbolismos da história de Lisboa e o que chamam de Sebastianismo.

Mas, se quiser um conselho, não leia tudo com a intenção de entender as palavras ao pé da letra. Deixe embriagar-se pela métrica e fluidez de Fernando Pessoa, se entregue ao som das palavras e deixe que elas cheguem ao seu coração, mantenha-se alerta e com a mente aberta para descobrir as riquezas dos versos simples e leve-os consigo para a vida.

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
(Mar Português)

Tenho que dar dois créditos antes de terminar o post, o primeiro vai para Jane Tutikian (1952) responsável pela organização e introdução feita de forma primorosa nessa edição. O segundo vai para a editora L&PM responsável pela democratização dos clássicos literários impressos em formato poket e vendidos a preços módicos nas bancas de revistas. Comprei o exemplar que vou abandonar na banca que fica na Av. Paulista, em frente ao Conjunto Nacional.

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
(O Infante)

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Estacionamento Shopping Barra - Mezanino G1
Data: 12/07/2016

domingo, 19 de junho de 2016

NÓS


No mesmo dia que comprei o já best seller Um Dia, escrito em 2009 pelo David Nicholls (1966), também comprei sua mais recente obra ‘Nós’, publicada no Brasil em 2015. Nos dois livros existe a perfeita construção de personagens que se caracterizam pelo realismo, bom humor, uma dose de criticidade de suas próprias atitudes e a humanidade. Você é capaz de amar e odiar os personagens com a mesma intensidade durante a leitura sem, contudo, enfastiar-se. E foi por aí que novamente fui conquistado.

No primeiro livro, Um Dia, já comentado aqui no blog em setembro de 2015, os personagens Em e Dex descrevem seus sentimentos e pensamentos para com o outro e ainda temos um narrador para as notas de bastidores. Em Nós, a versão da história é narrada sob o ponto de vista do personagem Douglas Petersen, um bioquímico de cinquenta e quatro anos, metódico, tímido, fatalista, extremamente organizado e casado com Connie há vinte e cinco anos. Ela é uma mulher vivida, gosta de arte, festas, muitos amigos, e vê em Douglas um porto seguro após relacionamentos anteriores muito conturbados. Ele é o feijão e ela é o sonho, uma inversão de papéis se compararmos ao livro de Origenes Lessa. Entre o casal está Albie, o filho de dezessete anos que cresceu entre a mãe artista que tudo permitia em nome da liberdade de expressão infanto-juvenil e o pai rigoroso que não encontrava no filho o seu espelho, seja nos gostos pelos mesmos brinquedos, profissão ou perspectiva de vida.

Antes de Albie ir para a faculdade a família programa as férias de suas vidas, um tour pela Europa que inclui cidades como Paris, Amsterdã, Veneza, dentre outras, para visitar os principais museus e obras de arte. Um roteiro traçado pela artista Connie e minuciosamente programado pelo metódico Douglas sem consultar os gostos estéticos da nova geração, Albie. Às vésperas da viagem Connie acorda Douglas no meio da noite para informa-lo que está pensando em divorciar-se dele. A partir desse momento seremos levados pela narrativa de Douglas para diversos tempos de suas vidas: quando conheceu Connie, quando casaram, o nascimento de Albie, suas vidas se transformando, tudo isso contado durante a epopeia de pequenos desastres, brigas, frustrações, pedidos de desculpas, momentos de comédia pastelão e reencontros que se transformará a viagem, ou grand tour como se refere Douglas.

David Nicholls constrói seu herói, ou anti-herói, com mãos de ferro. Quando o personagem tenta manipular a história para puxar o leitor para seu lado, o autor o faz contar coisas não muito boas do seu passado familiar, fazendo a balança pender para um lado e para o outro. Alguns leitores acham suas histórias arrastadas e com pouca ação, eu particularmente gosto do estilo que humaniza os personagens até que você comece a identificar-se com eles, no bom e no mau sentido.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Mesa da varanda - Restaurante Rama
Data: 11/07/2016

domingo, 12 de junho de 2016

TRÓPICO DE CÂNCER


Quando li Trópico de Câncer eu já era um velho, o livro havia sido publicado há mais de cinquenta anos e o autor, Henry Miller (1891-1990), já estava morto. Por isso eu não sofri quando a obra foi proibida nos EUA, sob a acusação de ser pornográfica, voltando a circular só em meados dos anos 1960. Aqui no Brasil também houve veto dos militares para tradução e venda, embora existam boatos de que livros em inglês circulavam contrabandeados entre os intelectuais da época. A chancela dos censores para a proibição estava no pressuposto de que a obra era autobiográfica, mesmo que o autor nunca tenha assumido isso por completo. Para eles a literatura erótica podia existir desde que tudo fosse ficção.

Autobiográfico ou não o certo é que Herry Miller sempre misturou sua vida pessoal com os livros que escreveu e quem o conheceu em Paris nos anos 30 sabia que as noites eram animadas. Lendo a obra temos uma narrativa ansiosa por revelar por quais recônditos andava o nosso autor. Sem necessidade de cronologia essa pressa narrativa é explorada em textos na primeira pessoa extraídos das experiências vividas nas camas onde dormiu com prostitutas ou senhoras solitárias, das bebedeiras em lugares não recomendados pela sociedade, mas seu viés filosófico vem principalmente da convivência com os intelectuais e artistas que, como ele, viviam sem dinheiro e a mercê de favores.

Logo no início o próprio autor nos alerta sobre o que vamos ler: “Isto não é um livro. Isto é injúria, calúnia, difamação de caráter. Isto não é um livro, no sentido comum da palavra. Não, isto é um prolongado insulto. Uma cusparada na cara da Arte, um pontapé no traseiro de Deus, do Homem, do Destino, do Tempo, do Amor, da Beleza... e do que mais quiserem.”

Na minha mais modesta opinião Trópico de Câncer é um livro erótico. E vai além do erotismo quando prepara o leitor para o próximo, Trópico de Capricórnio, que também li depois de velho e é o meu preferido.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Banco da pracinha em frente ao Teatro ISBA
Data: 10/07/2016

domingo, 5 de junho de 2016

O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO


Praticamente toda a minha geração leu O Apanhador no Campo de Centeio, único sucesso literário de J. D. Salinger (1919-2010) e figurinha fácil em várias listas de livros para ler antes de morrer. A obra tornou-se um ícone adolescente a partir dos anos 60 do século passado por tratar de temas como angústia, alienação, sensação de pertencimento do jovem, tudo embalado com uma linguagem típica da época, gírias e palavrões, demonstrando a rebeldia do anti-herói. Em 1951 não havia uma literatura voltada para a faixa entre 15 e 18 anos como nos dias de hoje e talvez por isso a obra foi tão discutida e abraçada.

No site da editora existe a informação que o livro foi traduzido para as principais línguas do mundo e ainda hoje vende cerca de 250 mil exemplares por ano, atingindo estratosféricos 65 milhões de cópias desde seu lançamento. Uma curiosidade sobre seu autor, J. D. Salinger, é que ele se recolheu após o sucesso do livro e viveu recluso até sua morte com raríssimas aparições para a imprensa. Chegou a publicar outros livros considerados pela crítica especializada como ‘sem relevância’.

A primeira vez que fiz a leitura eu tinha a mesma idade do protagonista do livro e passava pela minha fase adolescente rebelde. Acredito que exatamente por isso achei o livro parado demais e quase abandonei a leitura. A história de Holden Caulfield acontece num fim de semana e começa após ele saber que, devido às suas notas e ao seu mau comportamento, seria expulso no dia seguinte do prestigiado Colégio Pencey. Uma briga com seu colega de quarto é o estopim para uma peregrinação por Nova York que o levará ao encontro de Sunny, a prostituta, Sally Hayes, a ex-namorada, Phoebe, sua irmã mais nova, e o Professor Antolini. Apesar de conter passagens interessantes como a história do museu e o sonho do apanhador de crianças, eu achei o livro chatíssimo.

Posteriormente, aos vinte e quatro anos, reli a obra em outro contexto da minha vida e percebi que na primeira leitura faltou maturidade para entender as entrelinhas e o processo de transformação física e psíquica que passava pela cabeça do Holden. A narração na primeira pessoa é o ponto de partida para entender que pouco importa a ação do livro, o sentido está no que o personagem pensa. Todas as metáforas nos levam a perceber sua dificuldade em crescer, sair da infância e passar a ser adulto. Esse hiato é uma fase difícil até hoje, largar o infantil é perder a inocência das coisas e talvez o sonho do apanhador seja exatamente não deixar as crianças caírem no precipício, mantê-las num mundo perfeito em que brincar é a principal tarefa. Até hoje a obra é passível de críticas veementes e elogios eloquentes, eu passei pelas duas fases. Agora tente você.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Banco da praça em frente à igreja do Sr. do Bomfim
Data: 10/07/2016

domingo, 29 de maio de 2016

AI, QUE LOUCURA!


Você já ouviu falar na socialite carioca Narcisa Tamborindeguy (1966)? Assistiu ao programa Mulheres Ricas exibido pela TV Bandeirantes? Se você respondeu não para as duas questões anteriores esse livro não é para você. Esqueça, devolva, troque e não perca seu tempo porque a leitura será confusa, em alguns momentos rasa e em outros será eloquente demais. Mas se por acaso respondeu sim para as duas questões, ou apenas uma delas, então aproveite e divirta-se, mas não espere grande coisa.

É claro que uma história é sempre uma história. Principalmente se você for como eu e pensa que a vida de todo ser humano na face da terra pode render uma biografia. Guardadas as devidas proporções entre a lição de vida de Andressa Urach (Morri para Viver), Kéfera Buchmann (Muito Mais que 5 Minutos) ou Luan Santana (Luan Santana – A Biografia) e a obra sobre Nelson Mandela (A Luta é a Minha Vida), Mahatma Gandhi (Minha Vida e Minhas Experiências com a Verdade) ou Irmã Dulce (O Anjo Bom da Bahia), na minha humilde opinião, existem histórias que simplesmente foram contadas e existem histórias que fizeram a diferença no mundo. Ao terminar de ler o livro Ai, Que Loucura! percebi claramente que a história de Narcisa faz parte do primeiro grupo.

Se você acabou de ler Guerra e Paz (Liev Tolstoi) e tem pela frente O Segundo Sexo (Simone de Beauvoir) dê um refresco para seus pensamentos e leia Ai, Que Loucura! Será um oásis de frescurinhas entre dois livros “cabeção”. Narcisa relata sua vida entre a piscina do Copacabana Palace e uma carreira de cocaína, festas, alta sociedade, viagens, e outras memórias que as drogas não apagaram antes de se declarar ‘limpa’. E não precisa seguir os capítulos, a autora se encarrega de mudar abruptamente de assunto assim como o faz na vida real. Felizmente, para quem decidiu enfrentar as 136 páginas, ela ainda não havia criado os outros bordões: “Ai, que Absurdo!” e “Ai, que Badalo!”.

Agora podem me crucificar!

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Grade do portão lateral ao Teatro SESI - Rio Vermelho
Data: 08/07/2016

domingo, 22 de maio de 2016

TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA


Na época que prestei o vestibular pela primeira vez recebi um manual que informava a relação dos assuntos para estudar e também a lista dos livros que deveriam ser lidos. Era uma espécie de direcionamento ao aluno para obter um bom aproveitamento nas provas. A leitura das obras indicadas foi feita com tanto prazer que se tornou um hábito e por vários anos consultei a lista do vestibular como referência para minhas leituras, mesmo sem a necessidade de fazer as provas.

Foi exatamente por causa dessa lista que li Triste Fim de Policarpo Quaresma. A obra do mestre Lima Barreto (1881 – 1922) foi publicada em capítulos durante os meses de agosto a outubro de 1911 dentro do Jornal do Commercio, que na época era escrito com dois emes, e só lançada como livro em 1915 com o dinheiro do próprio autor. Lima era um apaixonado pelo Brasil e foi muito criticado pelos escritores da época pelo despojamento de seus diálogos, sempre fiéis ao modelo de romance realista, que resgatava as tradições da cultura popular.

Policarpo era o nosso Dom Quixote, impossível não comparar com o personagem criado por Miguel de Cervantes cuja trajetória de vida se confunde. Policarpo era um homem simples, por ser um leitor voraz era criticado pela vizinhança que não entendia porque um homem que não era professor ou acadêmico tinha tantos livros em casa. Ele se entrega ao conhecimento das culturas populares e decide aprender a tocar violão, um instrumento que via como representante do mais popular no país. É então que conhece Ricardo Coração dos Outros, um seresteiro que irá acompanha-lo por suas desventuras. Na repartição que trabalhava comete o desatino de escrever um memorando em língua Tupi, é taxado como louco e acaba internado num hospício. Passados alguns anos o já livre Policarpo é aconselhado por Olga, sua sobrinha, a comprar um sítio na fictícia cidade de Curuzu. Começa então a saga de Policarpo pela agricultura com o objetivo de ajudar no crescimento do Brasil. É quando estoura a Revolta da Armada e ele é convocado a liderar um grupo de voluntários sem nenhum treinamento. Seu destino é selado quando escreve uma carta ao Marechal Floriano Peixoto criticando e denunciando arbitrariedades cometidas contra os prisioneiros.

É incrível a atualidade desse livro escrito há mais de 100 anos. Não é uma leitura fácil para o vocabulário dos dias de hoje e exigirá uma imersão no universo de Lima Barreto e sua época. Seu personagem é o próprio slogan do “sou brasileiro e não desisto nunca”, um indivíduo cuja essência deveria ser injetada nas veias da maioria dos nossos representantes que estão em Brasília.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Pátio externo da Escola de Teatro da UFBa.
Data: 07/07/2016

domingo, 15 de maio de 2016

QUEBRA DE CONFIANÇA


Ultimamente Harlan Coben (1962) tem sido responsável por noites insones, quando começamos a leitura de um livro seu só conseguimos parar quando estamos na última página. Depois que li os primeiros quatro livros que estão catalogados como independentes: Não Conte a Ninguém, Confie em Mim, Seis Anos Depois e Desaparecido para Sempre, todos já comentados aqui no blog, iniciei a leitura da série Myron Bolitar pelo primeiro livro lançado em 1995 nos EUA, título do post.

Na metade do livro fiquei com a impressão de que o autor já tinha a intenção de escrever uma série e não acredito que isso aconteceu por acaso. Myron Bolitar é um personagem construído para ser carismático e um tanto quanto enigmático. Talvez por essa razão quando o livro começa ele já está na profissão de agenciador de talentos esportivos há dois anos. Sua carreira como jogador de basquete já está encerrada, fato que é explicado ao longo do livro, entretanto suas passagens como advogado e membro do FBI são apenas citadas sem maiores detalhes. Há um breve relato contando como conheceu seus dois fiéis companheiros: Win, o excêntrico milionário, e Esperanza, ex-lutadora e atual secretária. O mesmo não acontece com a personagem Jessica, o autor cita que já foram namorados, mas não esclarece porque terminaram embora fique claro que ainda nutrem uma forte atração um pelo outro.

Myron está prestes a fechar o primeiro contrato num clube de elite para Christian Steele, um quarterback promissor para o mundo milionário do futebol americano. Só que o jovem é atormentado pelo desaparecimento de sua namorada Kathy Culver há mais de um ano e a polícia não tem pistas do caso. Tudo piora quando Christian recebe o exemplar de uma revista pornográfica cujo anúncio de sexo por telefone aparece com uma foto de Kathy. Para enrolar mais a situação o pai de Kathy, Adam Culver, é assassinado numa tentativa de assalto muito suspeita. Jessica, filha de Adam e irmã de Kathy, tem certeza que as duas mortes estão relacionadas e isso faz com que se reaproxime de Myron.

A trama é muito bem amarrada exceto por um fio solto que não sei se será resolvido no livro seguinte, o personagem Chaz Landreaux fica sem final. A última citação ao seu nome é feita na página 232 quando Myron entra no escritório e pergunta a Esperanza: Conseguiu falar com o Chaz? E ela responde: Ainda não. Mas isso é só um detalhe já que é uma história paralela. A trama principal sobre o mistério de Kathy Culver é desvendada aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo e me deixou sem fôlego, tanto que reli as últimas trinta páginas só para saber se tinha entendido tudo por causa da velocidade que li na primeira vez.

Vale aqui uma ressalva para a construção da dupla Myron e Win, eles são imbatíveis nos quesitos: carisma, sarcasmo, companheirismo e boas piadas. Preste bem atenção em Win, por trás da aparência frágil, loira e quase pueril existe um ninja que não perdoa seus inimigos.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Shopping Passeo, 1o andar em frente a sorveteria.
Data: 25/06/2016