domingo, 29 de junho de 2014

HAROLD E MAUDE - ENSINA-ME A VIVER


Os meses de junho e julho são aqueles que considero meses de entressafra, há uma sensação de férias pairando no ar devido ao intervalo escolar e lembro bem de quando era garoto os cinemas só exibiam filmes infantis, era a hora e a vez das crianças e adolescentes formarem filas para ver Os Trapalhões, Xuxa e afins. O mesmo acontecia com as livrarias, suas vitrines eram quase temáticas com apelo maior que em outubro. Eu sempre vivo nessa época uma expectativa das minhas próprias férias e isso 70% das vezes significa viajar. Primeiro vem àquela sensação de querer dormir dias inteiros, separar-me física e mentalmente de todas as atribulações que tenho e entregar-me ao desfrute de dormir por 12 ou 14 horas seguidas e, sem nenhum compromisso a cumprir, viver o ócio sem qualquer rastro de culpa.

Como sou um homem velho sempre tenho aquela preguiça inicial de programar a viagem, e muitas vezes o faço com aquele pensamento: ‘se quiser posso desistir a qualquer momento’, tamanha a letargia que me consome, principalmente nos dias que antecedem o processo de arrumar mala, esperar para embarcar, conseguir um taxi, etc. Não tenho o espírito on the road da minha amiga Cybelle, essa se pudesse vivia na estrada, dirigindo, tal qual Thelma e Louise no filme homônimo.

Mas toda vez que penso nessa letargia eu lembro da Maude, um personagem literário que já virou filme e peça de teatro, do livro Hadold e Maude, ou como muitos conhecem; Ensina-me a Viver. Harold é um garoto enxaqueca de quase vinte anos apaixonado pelo tema da morte, ele passa os dias falsificando falsos suicídios que já não causam o menor efeito em sua mãe, que, resignada, tenta a todo custo arranjar uma namorada para o filho com a certeza de que quando ele se apaixonar vai parar com suas esquisitices. Maude é uma senhora de quase oitenta anos, apaixonada pela vida que enche seus dias numa incessante busca por aventuras, crescimento, aprendizados e novas experiências. Maude é tão bizarra quanto Harold, embora em polos opostos, e isso os atrai a ponto de virar romance, o que pode parecer estranho à primeira vista torna-se uma lição de vida quando nos damos conta que ambos fazem coisas comuns da existência humana que é viver, rir, chorar, amar e morrer.

Ensina-me a viver é um livro clássico, está em qualquer lista de livros que você tem a obrigação de ler antes de morrer, já inspirou milhões de pessoas mundo afora e tornou-se cult. Foi imortalizado nas telas com Ruth Gordon e Bud Cort, eu vi muitas versões no teatro, a última com Glória Menezes e Arlindo Lopes nos papéis principais e outra amiga Ilana Kaplan fazendo a mãe de Harold, impagável.

Uso meu lado Maude sempre que arrumo uma mala para viajar, fico imbuído pelo seu espírito aventureiro, quantas pessoas vou conhecer, quais lugares serei apresentado, quantos espetáculos assistirei, quais comidas provarei, e além do inovador fico feliz em rever amigos queridos em terras por onde já passei.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Porto da Barra - Banco da praça em frente ao Instituto Mauá
Data: 06/09/2014

domingo, 22 de junho de 2014

CHICO BUARQUE - TANTAS PALAVRAS


Não sou muito de ficar divulgando factoides extraídos das redes sociais, hoje vou abrir uma exceção para um texto que Caetano Veloso publicou dia 19/6/14 na sua página oficial no Facebook que diz:

“Chico chega aos setenta... O Brasil é capaz de produzir um Chico Buarque: todas as nossas fantasias de autodesqualificação se anulam. Seu talento, seu rigor, sua elegância, sua discrição são tesouro nosso... Chico está em tudo. Tudo está na dicção límpida de Chico. Quando o mundo se apaixonar totalmente pelo que ele faz, terá finalmente visto o Brasil.”

Sem levar para o lado ufanista, a declaração de amor de Caetano para Chico tem um quê de comemoração pelo aniversário do amigo, mas, essencialmente, enaltece o legado artístico do cantor, compositor e autor. Na quinta feira eu passei o dia inteiro ouvindo coisas de Chico das mais diversas fases, e reli alguns posts do blog que fiz referência à sua obra como: Ópera do Malandro e Gota D’Água (Mai/2012), Leite Derramado (Dez/2012), e decidi homenageá-lo de uma forma diferente abandonando o ótimo livro do jornalista Humberto Werneck (1945) chamado Chico Buarque – Tantas Palavras, edição de 2006.

Faço questão de citar a edição porque a publicação de 2006 é substancialmente melhor que a edição de 1989, a nova possui uma biografia compilada do Chico com fatos interessantes que começam na infância, a fase estudantil, participações nos festivais de música, suas desavenças com a ditadura, a paixão pelo futebol, seu lado escritor, e, claro, todas as canções desde Tem Mais Samba, que o próprio Chico enfatiza como sua primeira composição, até às do algum Carioca.

É um livro esplêndido e imperdível, conhecer a obra genial do Chico e ter a oportunidade de ler as letras de suas músicas como se fossem poemas, que na verdade o são, só nos engrandece, enriquece e emociona. Esse livro é tão bacana que só o estou abandonando porque por uma feliz coincidência tenho dois exemplares. Parabéns e vida longa ao Chico e boa leitura para quem achar o livro.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Praça Campo Grande - Em frente ao parquinho
Data: 01/09/2014

domingo, 15 de junho de 2014

AMAR SE APRENDE AMANDO


Há duas semanas estive no larguinho do Rio Vermelho aqui em Salvador e vi de perto as estátuas de Jorge Amado, Zélia Gattai e do cachorro que agora não me lembro o nome. Imediatamente me remeti à estátua do Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) na praia de Copacabana, Rio de Janeiro, que deu origem a esse ‘modismo’ aqui no Brasil. E como ainda estou naquela fase romântica pós dia dos namorados, esse ano bem disfarçado em virtude da abertura da copa 2014 de futebol que caiu no mesmo dia frustrando floriculturas, joalherias, restaurantes e principalmente donos de motel, fui procurar na minha estante o livro Amar se Aprende Amando, que li pela primeira vez em 1986.

Dono de uma obra vastíssima que inclui livros de poesia, prosa e literatura infantil da melhor qualidade, esse mineiro de Itabira fui um dos fundadores do movimento modernista no Brasil. Seus versos livres seguem a proposta de Mario e Oswald de Andrade mostrando que não se depende do metro fixo para se definir uma obra poética, seguindo uma linha mais objetiva e concreta.

Muitos dividem a obra de Drummond a partir de três vertentes, baseadas no mote Eu X Mundo:

Eu maior que o mundo – marcada pela poesia mais irônica e amorosa;
Eu menor que o mundo – marcada pela poesia de cunho mais social, cotidiana;
Eu igual ao mundo – marcada pela poesia metafísica, de cunho mais existencial.

Eu não sei distinguir essas fazes, prefiro cataloga-las da seguinte forma, a poesia que leio e deixo no livro e a poesia que leio e levo pra vida, na página 19 do livro que vou abandonar vocês lerão essa pérola:

O MUNDO É GRANDE

O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar.

Sorte de quem achar o livro.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Ponto de ônibus em frente ao Colégio Módulo
Data: 31/08/2014

domingo, 8 de junho de 2014

CINQUENTA TONS DE LIBERDADE


Estamos na semana que antecede ao dia dos namorados, nada mais clichê do que publicar um post sobre o amor, a literatura está cheia, e, apesar de ter antecipado o tema na semana passada com o ótimo O Teorema Katherine, aproveito o ensejo para abandonar o último volume da série Cinquenta Tons. Confesso a você, leitor do blog, que terminar de ler essa saga foi difícil, cheguei a comentar isso no post A Bicicleta Azul (18/5/2014). E volto a dizer, é muita cara de pau da autora espichar uma história para três volumes quando um único bem escrito já daria conta do recado.

Em Cinquenta Tons de Liberdade a escritora E L James (1963) descreve o casamento, a lua de mel, e o que Anastacia Steele, agora Anastacia Gray, chama de volta à vida normal. Só que nada que se refere ao casal pode-se chamar de “vida normal”. Por falta de assunto, entre um ‘meu cinquenta tons’ proferido por Anastacia e um ataque de fúria protagonizado por Christian por algum ato dela que fugiu ao seu controle, entre um ‘eu te amo para a vida toda’ dito pelos dois, e uma descrição do sexo entre eles cheia de orgasmos mútuos, nunca li sobre tantos orgasmos atingidos em toda minha existência, a história descamba para o thriller policial que daria inveja aos primeiros filmes do agente 007 pela ingenuidade e trama rocambolesca.

Nesse volume a troca de e-mails entre os dois, assim como as participações especiais do Inconsciente e da Deusa Interior, são raras. As brincadeirinhas sexuais pervertidas deixam de ser novidade e perdem a inventividade. O final do casal Gray é óbvio, assim como o passado obscuro de Christian é desvendado sem maiores reviravoltas. Todos os factoides narrados nas 518 páginas desse volume apenas servem de entretenimento para que leiamos as três últimas linhas que não fará mal algum em contar aqui:

Ele sorri e me beija novamente.
- Amo você, Sra Gray.
- Também amo você, Christian. Para sempre.

Tenho que dar um crédito para os dois últimos capítulos, dentro de uma divisão que a autora intitula ‘TONS DE Christian’. O primeiro é uma descrição do natal de Christian ainda garoto morando com a família Gray, e o segundo, mais divertido, é a mesma cena de Anastácia chegando para a entrevista com o todo poderoso Christian Gray que lemos no primeiro livro, só que agora sob a perspectiva dele, como se o papel de narrador estivesse invertido. Soa divertido e ao mesmo tempo preocupante, será que a autora vai lançar os três livros novamente só que dessa vez narrado pelo Christian... Espero sinceramente que não.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Ponto de ônibus em frente ao Colégio Módulo - Av. Magalhães Neto
Data: 30/08/2014

domingo, 1 de junho de 2014

O TEOREMA KATHERINE


Já li em algumas entrevistas que John Green (1977) nunca teve a pretensão de tornar-se um escritor de best sellers, mas isso aconteceu depois do estrondoso sucesso de A Culpa é das Estrelas, livro que li duas vezes, presenteei amigos e já abandonei, você pode ler o post aqui no blog em Novembro/2012, mas faça-o logo, antes que o filme apareça e você seja corrompido pelo escurinho do cinema antes de ler o livro.

O Teorema Katherine foi lançado seis anos antes de A Culpa, embora muitos pensem que foi depois porque as editoras saíram relançando as obras do autor quando perceberam o filão financeiro que o John se tornara. Assim como todos os mortais eu acabei lendo O Teorema depois e demorei a encontrar aquele jeito quase moleque de escrever que o autor se consagrou em A Culpa. Mas ele está lá. É um prenuncio do estilo de escrever que o tornaria uma celebridade mais tarde. E é criativo, envolvente, inusitado, mas você terá de perseverar e vencer as cem primeiras páginas. Não esmoreça e não se arrependerá. Tudo que ele descreve no início e pode soar enfadonho será necessário para entender sobre a vida de Colin Singleton, seus dezessete anos, o fato de ter um QI muito acima da média desde a infância, seu vício por anagramas, seus dezenove relacionamentos – todos com garotas chamadas Katherine, atenção para o fato de que não são Caterines ou Katerines, todos os dezenove “pés na bunda” que levou das amadas Katherines e sua missão para elaborar e comprovar o “Teorema Fundamental da Previsibilidade das Katherines”.

O teorema que Colin pesquisa tentará tornar possível prever, usando a linguagem matemática, o fim de qualquer relacionamento mesmo que as duas pessoas ainda nem se conheçam. E para entender o tal teorema você terá de mergulhar no mundo de Colin, seu amigo de estrada Hassan e a garota Lindsey. Perceberá que Colin quer ter um destaque na vida, o desejo de fazer algo pela humanidade e ser reconhecido por isso moverá sua vida amorosa expondo-a de formas inimagináveis. Lindsay é uma garota simples, que gosta da vida que leva, sem maiores pretensões, sem buscar a evidência para si, e o curtidor Hassan, despreocupado com a vida ele embarca nas loucuras de Collin para fugir da faculdade e será o nosso refresco, o mais engraçado dos três.

Não percam a explicação do Teorema, me deixou de boca aberta.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Hotel Sheraton da Bahia - Louge da recepção
Data: 02/08/2014