domingo, 25 de março de 2012

OLGA


O livro do Fernando Morais (1946) é intrincado, de um lado há a guerra desencadeada pelo nazismo, de outro, temos a miséria de uma ditadura militar no Brasil com seus crimes e seus maneirismos, e por outro lado, num triângulo, temos a história de amor de Olga Benario Prestes e Luís Carlos Prestes. O intrincado dessa história é desvendado com extrema dificuldade pelo autor, exatamente porque os documentos oficiais da época pouco se referem à personagem principal do livro.
O autor revela numa entrevista que: “mesmo a historiografia oficial do movimento operário brasileiro, produzida por partidos ou pesquisadores marxistas, relegara invariavelmente a ela o papel subalterno de ‘mulher de Prestes’ e nada mais que isso”. O livro tem um enfoque histórico do que aconteceu a esta mulher, judia e comunista, persona non grata aos dirigentes do Brasil e da Alemanha da época. Capturada, grávida de sete meses, Olga foi deportada para a Alemanha pelo governo Vargas, e acabou assassinada nos campos nazistas.
A obra foi lançada em 1985 e reeditada em 1994. Em 2004, Jayme Monjardim dirigiu a versão cinematográfica a partir da adaptação do livro com Camila Morgado (Olga), Caco Ciocler (Prestes) e Fernanda Montenegro (D. Leocádia Prestes) em atuações singulares. Dizem as más línguas, isto é, a crítica oficial, que o filme era extremamente televisivo e muito focado no amor de Olga e Prestes, sem muito enfoque histórico. Mas o povão curtiu e o filme ficou entre as dez maiores bilheterias do ano com mais de três milhões de espectadores.
Algumas curiosidades: As cenas no campo de concentração foram feitas em estúdio no Rio de Janeiro, e a neve que aparece era feita de sal grosso. Camila Morgado ganhou o prêmio de Melhor Atriz no Grande Prêmio BR de Cinema Brasileiro de 2005. A cena em que ela é separada da filha é considerada por algumas listas como uma das melhores cenas tristes de filmes nacionais de todos os tempos.
Eu gosto de ambos, em separado. O livro é o livro e o filme é o filme. Consigo ter um distanciamento de ambos, cada um na sua.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Praça Castro Alves
Data: 14/04/2012

domingo, 18 de março de 2012

ORLANDO


O mais popular livro da grande escritora Virginia Woolf (1882-1941), Orlando é uma biografia fantástica de um nobre inglês do século XVI. Nascido homem, sem nenhuma sombra de dúvida quanto a isso, atravessa o tempo e num belo dia acorda mulher. Suas aventuras e desventuras são narradas desde o século XVI até o dia 28 de novembro de 1928, data em que o livro foi oficialmente lançado. Orlando é um nobre e está constantemente em busca do amor e da arte. E é através dele que Virginia Woolf apresenta um panorama das transformações sofridas na Inglaterra e nos brinda com divertidas comparações entre homens e mulheres, que acima de tudo servem para desenhar o personagem título do livro como um ser humano, independente do sexo.
Virginia Woolf era uma visionária, esta obra foi escrita em 1928 e, dadas as devidas proporções, permanece no topo da modernidade. Suas obras mais marcantes como Mrs Dalloway (1925), Passeio ao Farol (1927) e Orlando (1928), revelam a grande autora, pensadora e a mulher atormentada pela existência em si. Fato esse que a levaria a cometer suicídio de uma forma tão incomum. No dia 28 de março de 1941 ela vestiu um casaco, encheu seus bolsos com pedras e entrou no Rio Ouse, afogando-se. Seu corpo só foi encontrado no dia 18 de abril. Virginia deixou um bilhete para seu marido, Leonard Woolf, e para a irmã, Vanessa. Neste bilhete, ela se despede das pessoas que mais amara na vida.
Adaptar essa obra para o cinema não foi fácil, em 1993, com uma direção segura, Sally Potter empenhou-se e fez um trabalho primoroso. Desde a escolha do elenco, e aqui cabe um parêntese para falar de Tilda Swinton, uma das atrizes mais andróginas que já vi em cena, fazendo-nos esquecer de que é uma mulher interpretando um homem durante a metade do filme. Além dela temos Quentin Crisp no maravilhoso papel da Rainha Elizabeth I e um Billy Zane carregado na feminilidade, mesmo fazendo um papel masculino. Isso sem falar dos figurinos, direção de arte, fotografia e a trilha sonora memorável, que ouço agora enquanto escrevo o post.
Para quem já leu Orlando e sabe que o narrador no livro é uma peça chave para a comicidade e os pensamentos de Virginia Woolf, saiba que o filme não tem narrador, mas, na minha humilde opinião, não se perde nada por isso. As encaradas de Orlando para a lente geram no filme a cumplicidade que o narrador tem conosco no livro. Vale a pena ver e vale à pena ler, sem sombra de dúvida.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Sorveteria Cubana
Data: 14/04/2012

sábado, 10 de março de 2012

ESTAÇÃO CARANDIRU


O livro Estação Carandiru é considerado um best seller, um dos maiores fenômenos editoriais brasileiros, com mais de 460 mil exemplares vendidos e Prêmio Jabuti de 2000 na categoria de Livro do Ano de Não-Ficção. É um relato contado e vivenciado pelo próprio autor, Dr. Drauzio Varella (1943), no maior presídio do Brasil, hoje desativado e parcialmente demolido. Essa convivência com os presidiários e funcionários na Casa de Detenção de São Paulo teve início em 1989 quando foi desenvolvido um trabalho voluntário de saúde e principalmente na prevenção à AIDS que resultou no conteúdo do livro.
Dr. Drauzio nos descreve desde a divisão física da Casa de Detenção até a ‘sociedade carcerária’, suas regras, o dia a dia e os casos contados pelos detentos e funcionários, além de fatos presenciados, e termina com um relato do massacre de 1992, quando foram assassinados cento e onze detentos no "Pavilhão 9". O autor registra que, segundo os presos, foram mais de "...250 mortos, contados os que saíram feridos e nunca retornaram". O mais interessante do livro são os relatos dos presos, impossível ficar imune às histórias de Santão, Maria-Louca, Deusdete e Mané, Neguinho, Veronique e Sem-Chance.
Em 2003, inspirado no livro, Hector Babenco dirigiu o filme Carandiru, é uma produção Brasil/Argentina orçada em doze milhões de reais. As cenas em que o universo das celas é retratado são excelentes, a redenção do preso Peixeira, interpretado pelo ótimo Milhem Cortaz, é única, e o massacre dos presos é de uma veracidade arrepiante. Luiz Carlos Vasconcelos interpretou com brilhantismo de discrição o Dr. Drauzio Varella e Rodrigo Santoro como Lady Di é completamente desnecessário, pode-se notar que o ator está deslocado para o papel, um notório erro de casting para uma infeliz jogada de marketing afim de atrair mídia para o filme, na minha humilde opinião “pagou mico”.
Claro que o livro é melhor.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Iate Clube da Bahia - escada de acesso a piscina
Data: 06/04/2012

domingo, 4 de março de 2012

EXPRESSO DA MEIA NOITE


Ao escrever o post anterior tive a idéia de começar uma nova série e abandonar livros que foram adaptados para o cinema. Olhando minha estante vi uma quantidade enorme de livros que foram abduzidos pelos roteiristas de cinema, para o bem e para o mal, e, lendo o histórico do blog, percebi que já falei sobre esse assunto em alguns momentos: O Perfume, A Insustentável Leveza do Ser, O Outro Lado da Meia Noite, A Casa dos Espíritos, O Exorcista, Tubarão, O Grande Gatsby, O Chefão, O Colecionador, Hannibal, A Fogueira das Vaidades, Macunaíma, Feliz Ano Velho, O Fugitivo, A Última Música, Água para Elefantes, e vários outros.
Expresso da Meia Noite é um livro autobiográfico que conta a história de um erro. A transformação que acontece na vida de Billy Hayes quando ele tenta embarcar no aeroporto de Istambul carregando uma quantidade de haxixe que pretendia revender e ganhar um dinheiro “fácil”. Ao fazer isso Billy cometeu o maior erro de sua vida e pelo qual pagaria um preço enorme: uma condenação na mais imunda e brutal das prisões da Turquia onde seria espancado, seviciado, degradado e assistiria a cenas horríveis.
Na prisão, já cumprindo a condenação de quatro anos, Billy fica sabendo que o governo turco havia aumentado sua pena para trinta anos, desesperado com tudo que estava passando e vendo que os esforços de seus pais não estavam dando certo, ele conta com a ajuda dos amigos que fez na prisão para tentar fugir. Max, o viciado da prisão, conta para Billy o segredo da fuga já que estava doente demais para por em prática o engenhoso plano.
A adaptação do livro para o cinema ficou a cargo de Oliver Stone e ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. A direção primorosa de Alan Parker deu um contexto sombrio nas cenas da prisão/manicômio e um cunho sensacionalista no final. Brad Davis no papel de Billy Hayes está estupendo em sua atuação.
Cabe lembrar que o filme é diferente do livro, como sempre, recomendo primeiro a leitura e depois o filme. Emoção garantida.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Fran's Café - Graça
Data: 05/04/2012