domingo, 27 de setembro de 2015

MEU AMIGO MAIGRET


Era fevereiro do ano de 2010 quando resolvi criar um blog sobre literatura e fiz previamente uma seleção dos livros que pretendia escrever. Eu tinha acabado de mudar para um novo apartamento e percebi que na nova moradia não caberiam todos os livros que um dia embarquei de Salvador para São Paulo e agora, quase treze anos depois, fazia o caminho inverso com um volume muito maior. Como não queria simplesmente doar, ou vender para um sebo, a ideia de escrever sobre eles e depois abandonar pela cidade tomou forma e estamos aqui.

O quarto livro que abandonei foi A Velha Senhora cujo autor Georges Simenon (1903-1989) eu conheci de forma bem inusitada. Já contei essa história no post em questão mas vou repeti-la. Estava assistindo um capítulo da novela Brilhante (Globo – 1982) quando a personagem Chica Newman, interpretada pela Fernanda Montenegro, chique, refinada, rica e a vilã da história, está lendo um livro quando seu motorista Carlos, interpretado pelo Cláudio Marzo, entra na sala para avisa-la de alguma coisa e, percebendo o livro, comenta que também gosta do autor. Chica então elogia seu refinamento literário e a cena acaba com um olhar de admiração da patroa pelo motorista, não à toa havia uma química entre os dois que acabam juntos no último capítulo após a redenção da personagem e para espanto de muitos.

Curioso, fui atrás da obra de Simenon e li A Velha Senhora. Até hoje, volta e meia, leio um de seus mais de cem títulos escritos para o comissário Maigret quando quero dar um tempo na literatura contemporânea. Alternar esses tempos me enriquece profundamente. Meu Amigo Maigret foi escrito em 1949, mais de meio século depois a obra está intacta e Jules Maigret continua sendo meu anti-herói favorito. Antes de ser policial ele é uma pessoa comum, não há genialidade nos casos que desvenda, não há comportamentos excêntricos ou hábitos diferentes que o marcariam, não há golpes de mestre e nenhum raciocínio dedutivo espetacular, ele é um ser humano que busca compreender o que há de melhor e pior nos seus semelhantes investigados. O mérito da escrita de Simenon é que a obra não é concentrada o tempo todo na figura do comissário, deslocando a atenção para o contexto que está inserido.

Nesse livro o comissário depara-se com um crime que envolve antigos conhecidos seus, um homem e uma mulher, ex-marginais que ele ajudou no passado. Só que dessa vez a polícia vai designar um membro da Scotland Yard, Mr. Pyke, para acompanha-lo e conhecer seus métodos. Maigret vive uma saia justa porque não possui método algum de trabalho, como traduzir em teoria o que se passa no interior de um homem que nunca sabe como vai iniciar uma investigação. Como dizer ao colega que não é a polícia, nem o crime ou a solução deste, que o motiva e o impulsiona.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Salvador Shopping - 2o. andar
Data: 29/11/2015

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