domingo, 22 de março de 2015

DENÁRIO DO SONHO


Tenho uma predileção por escritores requintados, e quando digo isso não me refiro à palavra ‘requinte’ como sinônimo de glamour ou riqueza e sim à delicadeza da escrita, a elegância, a sutileza e ao bom gosto. Marguerite Yourcenar (1903-1987) foi assim nos seus escritos, já comentei aqui no blog sobre dois livros de sua autoria, A Obra em Negro (out/2013) e Memórias de Adriano (jul/2014), este último estará para sempre qualquer lista que eu faça sobre livros indispensáveis na vida de um ser humano.

Ao escrever o parágrafo acima sou embalado por Nina Simone cantando For All We Know e a música cabe perfeitamente no processo criativo desse post, o requinte da estrutura narrativa de Marguerite com a voz de Nina. A música fala de relações humanas, despedidas e sentimentos que talvez nunca tenhamos coragem de confessar, por isso o hoje é urgente. O livro, apesar de envolvo na aura histórica do fascismo italiano, permanente preocupação da autoria com o leu legado, trata de relações humanas e suas variadas e inimagináveis vertentes.

O Denário, que dá título ao livro, é uma antiga moeda italiana que correspondia ao salário diário de um trabalhador. No romance a moeda assume o papel de elo entre os personagens, ao passar de mão em mão torna-se o símbolo de contato entre as pessoas, suas vidas, anseios, amores e à melancolia da indignação muda. Na minha modestíssima opinião é incrível a maneira como a autora entrelaça as vidas, os sonhos e o convívio entre as pessoas. Um livro rico em diversidade sobre o dito e o não dito.

Dito isso entrego aqui três citações do livro, não vou informar a página de propósito para que você leia o livro e tenha a surpresa sobre o pensamento ou a palavra.

“O amor não se compra: as mulheres que se vendem apenas se alugam aos homens; mas compra-se o sonho – substância impalpável que se transaciona sob várias formas.”

“Giulio iludira-se na esperança de que as manias da mulher se fossem atenuando com a idade; envelhecendo, os defeitos de Giuseppa, ao contrário, haviam crescido monstruosamente como seus braços e a cintura; sob a garantia de trinta anos de intimidade conjugal, ela não os dissimulava mais do que as imperfeições físicas.”

“Começara por nutrir relativamente a Carlo esse sentimento de que somos mais ricos, a indiferença, pois que o devotamos a cerca de dois bilhões de seres humanos.”

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Passeio Público - Teatro Vila Velha
Data: 07/06/2015

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