domingo, 29 de dezembro de 2013

CHIC


Estou na frente do computador vasculhando minha lista de livros em busca de algo especial. Tarefa difícil uma vez que todos os livros que li de alguma forma são especiais. Alguns serão lidos uma única vez, mas há outros que já reli umas dez vezes e ainda não me dei por satisfeito. Estou escrevendo o último post do ano de 2013 por isso procuro algo diferente e, de certa forma, inusitado. Desisto da consulta pela lista, é que tenho catalogado tudo que já li, e vou para a estante olhar os livros, esse processo me acalma e tira da minha frente o branco da tela do computador.

Me chamou a atenção um livro fora do padrão comum de tamanho e quando o vejo de perfil percebo que é o livro da Gloria Kalil, CHIC – Um Guia Prático de Moda e Estilo. Lembro quando comprei esse livro que todo mundo comentava, era quase um best seller, guardadas as devidas licenças poéticas que ouso cometer aqui no blog. Não sou muito chegado a guias, só os de viagem e olhe lá, mas moda e estilo é um assunto que também me interessa. Afinal, quem não quer estar na moda e ainda por cima ter estilo?

Acho a Gloria Kalil uma mulher com muito estilo, chic sem ser pretenciosa, elegante por natureza e com um enorme carisma para comunicação. Ela fala e você escuta, ouve, assimila, compreende e sabiamente faz uma adaptação do que ela disse para o seu cotidiano. Foi assim que li esse livro, entendendo o ponto de vista da autora e fazendo uma triagem do que serve para mim. Foi através dele que aprendi a arrumar uma mala só com o necessário, recentemente consegui passar cinco dias em Buenos Aires com tudo que precisava em apenas uma mochila, fui a lugares diversificados e não passei aperto com a célebre frase: “Com que roupa eu vou?” Ela me deu dicas excelentes que levo para a vida toda. Ao longo das 250 páginas tem muita informação de moda, etiqueta, cidadania e estilo de vida.

Chic é um livro interessante e genérico, a Gloria escreveu outros mais temáticos como Chic Homem, Alô Chics! e Chic(érrimo). Se você os ler com serenidade saberá encontrar o seu estilo pessoal e entender aquelas regrinhas básicas que são universais, desenvolver uma consciência de moda, autoestima e personalidade para o dia a dia, fugindo da padronização que a indústria nos imprime.

Cidade do abandono: Rio de Janeiro/RJ
Local: Restaurante Foccacia
Data: 13/02/2014

domingo, 22 de dezembro de 2013

O PASTOR


Já escrevi aqui no blog que o Natal não é o meu feriado favorito, as comemorações viraram uma espécie de “obrigação” e o presente deixou de ser um momento de descontração e alegria para tornar-se uma distribuição infinita de sacolas de grife, porque se não for de grife a cara de decepção do presenteado é certa. Entretanto, como sempre acho que tudo na vida vale a pena, o Natal é a época dos panetones, eu adoro panetone, e também da programação especial na TV que tem um ‘q’ de igual variado, se é que isso é possível.

Na literatura temos poucas obras com o tema natalino que realmente valem a pena e eu fui buscar no fundo da minha estante uma fábula de Natal, intitulada O Pastor. Publicado em 1982 esse conto, ou fábula, foi escrito por Frederick Forsyth (1938), ele mesmo, o autor de O Dia do Chacal, O Dossiê Odessa, Cães de Guerra e O Quarto Protocolo, só para citar meus preferidos. Frederick é um autor de livros thrillers, se é que essa categoria existe, e sua formação e atuação como jornalista na BBC, Daily Express e revista TIME, contribuíram muito para torna-lo um expert em livros de ação com conteúdos históricos reais.

O Pastor é um livro diferente no contexto de sua obra, é um conto, ou uma fábula, como eu gosto mais de chama-lo. E é da experiência do autor como piloto de aviões que surge a ideia para essa obra comovente e quase lúdica.

Conheceremos a história de um jovem piloto da Royal Air Force (RAF) que recebe uma licença para comemorar o Natal com a família no Reino Unido. Com um luar belíssimo no céu noturno e gélido da Alemanha ele decola sozinho em seu avião de caça para sobrevoar a Holanda em direção ao Mar do Norte. Uma pane na aeronave muda o rumo da tranquila viagem, ele está perdido no nevoeiro e o avião começa a perder altitude, o rádio não funciona e o radar, assim como a agulha da bússola, gira sem controle. O jovem piloto sabe que morrerá em poucos minutos. Quando tudo parecia perdido e o combustível já se esgotava nos tanques, apareceu uma ajuda inesperada.

Coisas que só acontecem na noite de Natal.

Cidade do abandono: Salvador/BA - Rio de Janeiro/RJ
Local: Voo 6211 - Avianca - Bolsa da poltrona 17K
Data: 12/02/2014

domingo, 15 de dezembro de 2013

TREM NOTURNO PARA LISBOA


Esta é uma época muito propícia para pensar nos amigos e embora eu tente fazer isso durante todo o ano, quando chega o mês de dezembro e somos tragados pelas mensagens de “amor, paz, amizade”, distribuídas gratuitamente pela TV, rádio, jornal, redes sociais, fica quase impossível não se envolver. E quando digo “quase impossível” é porque recentemente li um post chamado “Saudade de Mim” no Blog do Roberto Camargo, e parei para pensar na qualidade da minha amizade com o Roberto e o quanto hoje em dia nos isolamos de nós mesmos tentando ficar antenados e plugados vinte e quatro horas por dia com a humanidade.

Ele é um amigo herdado dos tempos que eu morava em São Paulo. Isso porque Roberto era amigo do Ricardo Castro, e quando este voltou a morar em Salvador nós nos aproximamos muito, ele é gaúcho e eu baiano, ambos chegados à pauliceia e com pouquíssimos amigos. Nesses quase dezessete anos de amizade tivemos altos e baixos, concordamos e divergimos em vários aspectos, mas nunca sem perder a ternura e o carinho que sentimos um pelo outro. Agradeço sempre o legado cultural que o Roberto traz para minha vida, de Corine Rae à diva Stacey Kent, do grupo Terça Insana à Bertold Brecht passando pela sua maior intérprete no Brasil, Cida Moreira, dos encontros em sua casa regados a bebidas e conversas variadas, música e boa comida. Isso sem falar nos livros, muitos livros.

Pegando o foco sobre o quanto uma pessoa pode transformar a vida de outra, lembrei-me de um livro que o Roberto me emprestou quando estive em sua casa pela última vez, Trem Noturno Para Lisboa, escrito por Peter Bieri (1944) sob o pseudônimo de Pascal Mercier. No livro somos contemplados por duas histórias, na primeira pessoa pelo professor de línguas clássicas, Raimund Gregorius, cuja vida seguia uma rotina de invisibilidade até o encontro com uma mulher portuguesa no caminho para a escola. Desse encontro Gregorius toma uma atitude inusitada, levanta-se no meio de uma aula e sai da sala assustado com a súbita consciência de que a vida se esvai. Na busca pela incógnita mulher ele vai parar na sua livraria preferida e numa sucessão de estranhos fatos daquela manhã lhe cai às mãos um raro exemplar de um livro escrito pelo médico, poeta e pensador português Amadeu de Prado.

A partir desse momento seremos tragados pelas duas histórias, Gregorius e Prado, e uma infinidade de reflexões sobre solidão, finitude, morte, amizade, amor e lealdade. No fim na leitura fiquei com a sensação de que fugir de uma rotina opressora nem sempre é fácil, assim como conhecer pessoas, compreender suas vidas, e saber o que cada um acrescenta para o conhecimento de nós mesmos.

O exemplar desse livro que o Roberto me emprestou está aqui em casa, com todos os grifos feitos por ele, comprei outro somente para abandonar e nele tomei a liberdade de acrescentar os grifos do Roberto e os meus. Boa leitura para você que o encontrar.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Varanda do Restaurante Rama - Barra
Data: 18/01/2014

domingo, 8 de dezembro de 2013

O VERÃO ANTES DA QUEDA


Estou há dias pensando em como escrever sobre Doris Lessing (1919-2013), sua morte recente em 17 de novembro fez com que minha memória, que já não é tão boa, ficasse remoendo fatos e acontecimentos. O fato é que li pouco a obra dessa autora e estava relutante em abandonar um dos poucos livros que tenho dela. Mas não posso me furtar ao compromisso assumido aqui no blog e a leitura que fiz de artigos sobre Doris durante esses dias só reforçou a urgência em homenageá-la.

O Verão Antes da Queda não é um livro feminista, publicado em 1973 com o título original de The Summer Before the Dark conta a história de Kate Brown. Principal personagem do livro, Kate é uma mulher de 45 anos, charmosa, competente e muito inteligente. O marido se ausenta durante uma temporada de verão e os filhos já adultos do casal não moram mais em casa. Coincidentemente às novas perspectivas profissionais que se abrem para Kate, ela conhece e apaixona-se por um homem bem mais novo. Um futuro totalmente novo estava lhe acenando, realizações materiais e sentimentais a tentavam, o jovem amante acabaria por fazê-la confrontar-se com o passado trazendo a tona coisas que ela pensou ter esquecido.

Relendo hoje esse livro e comparando-o aos mais diversos tons de cinza, e a toda literatura erótica que veio no seu rastro, percebo a força das palavras de Doris numa época que as feministas mais ferrenhas taxavam e categorizavam tudo que viam pela frente. É um bom livro, complexo e lindamente escrito, com excelentes perfis dos personagens que nele circulam e um bom final de efeito comovente.

Doris Lessing ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 2007 e sofreu uma enxurrada de críticas; Harold Bloom, crítico literário, definiu a decisão como “politicamente correta” e disse: “Ainda que a senhora Lessing no começo de sua carreira tenha tido algumas qualidades admiráveis, penso que seu trabalho nos últimos anos é um tijolo”. Outro crítico, Marcel Reich-Rannicki, considerou o Nobel como uma “decisão decepcionante” e declarou na feira do livro de Frankfurt: “A língua inglesa tem escritores mais importantes e mais significativos como John Updike e Philip Roth”. Também Umberto Eco admitiu certa surpresa na premiação e declarou: “É estranho que um autor de língua inglesa venha a ganhar o prêmio tão pouco tempo depois de Harold Pinter”.

Passados um ano da premiação Doris Lessing disse num programa de rádio que o fato de ter recebido o prêmio redundou num “maldito desastre”. Isso porque a demanda da mídia com pedidos constantes de entrevistas e fotos lhe tirou toda a energia para escrever uma linha que fosse nos últimos tempos.

Ela era assim.

Cidade do abandono: Rio de Janeiro/RJ - Salvador/BA
Local: Voo 2534 - Azul - Bolsa da poltrona 12D
Data: 16/01/2014

domingo, 1 de dezembro de 2013

CLEO E DANIEL


Vou logo avisando, Cleo e Daniel não é um livro de leitura fácil. E logo emendo para te deixar sem folego, é um excelente livro para fazer você pensar na vida. Ótima opção para épocas de fim de ano, quando o ano novo se aproxima e somos invadidos por reflexões e listas de promessas para os próximos 365 dias.

A história de um psicanalista meio frustrado, Dr. Flugeman, e dois jovens, Cleo e Daniel, concebidos no período que chamamos de baby-boom, logo após o término da Segunda Guerra Mundial antes da propagação dos anticoncepcionais e do sexo avulso. O Roberto Freire (1927-2008) enfatiza os excessos do médico na esteira dos problemas do casal de adolescentes que se conhece na antessala do seu consultório. Cleo foi levada para recuperar-se psicologicamente de um aborto imposto pela mãe, socialite paulistana, as consultas são um oásis entre as festinhas privê regadas a álcool e barbitúricos. Daniel, rebelde sem causa em constante conflito com os pais, aceita ir às consultas na esperança de conseguir receitas para comprar os comprimidos que se viciou em outro tratamento.

O livro foi publicado em 1966 e ainda hoje é um retrato da adolescência que não está preparada para lidar com os próprios problemas. É a geração do exagero, desesperada para sentir alguma coisa e saber o que o futuro lhes reserva. A ansiedade para que tudo aconteça rápido é impulsionada pelo álcool, drogas, experimentação do sexo e conflitos paternos constantes. O médico exerce nos jovens o poder do homem mais velho permissivo e sem julgamentos, tratando-os como cobaias para suas próprias frustrações.

Sem dúvida um livro para fazer pensar no que ainda está por vir.

Cidade do abandono: Rio de Janeiro/RJ
Local: Hotel Guanabara - Gaveta do armário - Apto. 1022
Data: 16/01/2014