domingo, 16 de setembro de 2012

MAR MORTO


Eu tinha 15 anos quando li Mar Morto pela primeira vez. Tenho até hoje a edição de número 42, surrupiada da biblioteca do colégio Dois de Julho, emprestada pela condescendente bibliotecária que agora me foge o nome. Era obra proibida para menores por ter, segundo os padres que administravam o colégio, linguagem pornográfica. Lia avidamente nos intervalos das aulas um livro secreto com a capa forrada em papel de presente. Na verdade, exceto algumas passagens, digamos, eróticas, o livro é uma aula sobre o candomblé e os costumes do cais do porto da época.

É o quinto livro da extensa obra de Jorge Amado (1912-2001), que usa o romance entre Guma e Lívia como pano de fundo para "as histórias da beira do cais da Bahia", como diz o escritor na primeira frase que abre o livro, histórias dos mestres de saveiro que tem o destino traçado por muitas gerações; o dos homens que saem para o mar e que um dia serão levados por Iemanjá.

As tradições, ou “leis do mar”, ensinadas pelo Seu Francisco ao jovem e destemido sobrinho Guma vão desde o remendo das redes, a lida com as faces da lua e como domar as tormentas em alto mar. Mostra também o poder do candomblé e as crenças nos orixás, a veneração por Iemanjá – a deusa do mar – sentida pelos pescadores de todo o recôncavo.

Na minha humilde opinião é uma obra ímpar, escrita por um Jorge com 24 anos de idade e que vai marcar sua trajetória de consciência política. A inclusão dos personagens da professora Dulce e do médico Rodrigo, não por acaso dois forasteiros, é definitiva para despertar a consciência do povo do cais contra o marasmo e a opressão.

Quando escreveu Mar Morto Jorge Amado era um jovem visionário, politizado e artista. Ainda não tinha a real dimensão da sua obra nem o alcance que ela teria. Neste ano de 2012, se vivo estivesse, Jorge completaria 100 anos. Fica aqui o registro da minha simples homenagem a uma obra extraordinária e infinita.

Cidade do abandono: Rio de Janeiro/RJ
Local: Aeroporto Galeão
Data: 13/11/2012

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