sexta-feira, 6 de abril de 2012

O BEIJO DA MULHER ARANHA


O escritor Ignácio de Loyola Brandão disse sobre O Beijo da Mulher Aranha: "Numa cela, dois presos. Um, político, heterossexual convicto. O outro, um homossexual, acusado de corrupção de menores. O que se pode fazer na solidão de uma cela que fede, o heterossexual está com os intestinos soltos, senão conversar o tempo inteiro? Falar da vida, da realidade, das coisas que aconteceram em suas vidas. E quando não há vida, ou ela é brutal demais, é necessário reinventá-la... E de repente, do meio da imundície daquela cela, da solidão de dois homens diferentes, mas ligados pelo que tem de humano, ambos vítimas da mesma violência de um regime, surge um quadro terrível de um sistema político social. Um livro político que não é chato, nem estereotipado, nem panfletário. Surpreende a cada passo." É uma boa descrição, uma boa orelha de livro, mas falta falar da fantasia, sim, é a fantasia que move o livro. Mesmo com todos os adendos e explicações de rodapé, é a inexistência do narrador e os diálogos bem construídos entre os personagens que torna toda a história sutil e apaixonante. Como bem o disse Ignácio, Manuel Puig (1932-1990) nos brinda com um livro surpreendente a cada “página”.
Molina e Valentín são dois homens acuados, suas sexualidades e disparidades no modo de encarar a vida são desvendadas logo no início e, entre eles, há uma pressão partidária. Valentín cobra de Molina o engajamento com a realidade e a crueza do regime político em que vivem. Molina cobra de Valentín a possibilidade de viver com leveza e para isso reinventa filmes e histórias com a finalidade de entreter nos momentos de dor. Cada um recebe do outro o que o outro tem de melhor e despem-se de preconceitos, traições e violências.
Adaptado para o cinema em 1985, o filme foi dirigido por Hector Babenco com um elenco estrelar: Raúl Juliá (Valentín), William Hurt (Molina) e Sônia Braga (Leni Lamaison/Marta/Mulher Aranha). Produzido com baixos custos o filme arrecadou dezessete vezes mais que o valor gasto. Sônia Braga na fase belíssima sofreu para dizer suas falas, ela ainda não dominava o inglês e foi necessário decorar foneticamente palavras e frases, perdendo, na minha humilde opinião, a expressão natural de atriz.
O ator Burt Lancaster iria fazer o papel de Molina mas foi impedido por um problema cardíaco, Raúl então sugeriu o amigo William Hurt e este interpretou magistralmente o afeminadíssimo Molina arrebatando o Oscar de Melhor Ator em 1985. O filme marcou a história dos prêmios Oscar: Hurt foi o primeiro a receber a estatueta de Melhor Ator por interpretar um personagem abertamente homossexual, e O Beijo da Mulher Aranha foi o primeiro filme independente da história a ser indicado ao prêmio de melhor filme.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Restaurante Suan Lon
Data: 29/04/2012

2 comentários:

  1. Faz pouco tempo que li O beijo da mulher aranha e não que não tenha gostado, mas acho que criei uma expectativa muito grande por ter lido a critica (antes de lê-lo)do Ignácio de Loyola Brandão, esperava um livro com detalhes da pressão da ditadura, com uma enfase maior na politica da época.
    Posso não ter entendido a alma do livro, mas pra mim ele fala muito mais de sexualidade e homossexualismo do que realmente de política.
    Os diálogos são dinâmicos, gostosos de serem lidos, mas acho que o autor se perde nas notas, tentando explicar o homossexualismo (tem nota que toma 2,3 páginas).
    Achei bacana o envolvimento dos dois, um aprendendo com o outro, e interessante como o autor consegue descrever uma cena de sexo sem ser vulgar.
    Enfim, pode ser um ponto de vista bem simplista mas pra mim ficou muito a desejar.
    Abraços.
    Tarcila Schultz

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  2. Tarcila, concordo com seu ponto de vista em relação ao excesso de notas no livro, tem momentos que chega a ser chato. Percebi que poderia ler as notas depois, então mandei brasa no livro em si. A política é mesmo um pano de fundo, sem aprofundamento, para o relacionamento dos dois. Você pegou a essência do livro "um aprendendo com o outro".
    Obrigado por visitar o blog.
    Abraço,
    Odilon

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