domingo, 29 de abril de 2012
EU SEI QUE VOU TE AMAR
O ano era 1984, eu tinha 21 anos e achava que já sabia tudo. Tinha a prepotência dos jovens e, naquela época, era nos livros, no teatro e no cinema que se buscava referências para a vida. A Internet ainda era um sonho para cientistas e não tínhamos a facilidade de hoje para a difusão de informações. Foi exatamente nesse ano que assisti ao filme Eu Sei Que Vou Te Amar, com roteiro e direção de Arnaldo Jabor (1940), e confesso que esse filme derrubou minha prepotência; primeiro porque eu não entendi o filme, era moderno demais, inovador demais para a minha cabeça ‘chapliniana’, segundo porque o texto era por demais direto e cruel e isso me incomodou.
Dois anos depois eu entro numa livraria e dou de cara com o livro, na capa a foto do cartaz do filme, o mediano Thales Pan Chacon e a jovem talentosa Fernanda Torres. Imediatamente comprei e o li em duas horas, depois reli, e reli. A descoberta de que eu ainda não entendia muito daquele jogo de palavras instigante do jovem casal foi a pá de cal no que havia restado da minha prepotência.
Eles estão recém separados após seis anos de casamento e marcam um reencontro depois de três meses sem se ver. O filme basicamente se passa na nova casa dele, uma mansão projetada por Oscar Niemeyer. Um início tímido com diálogos entrecortados e contidos, como se fosse o primeiro encontro de namorados, vai aos poucos dando lugar a um tsunami de emoções traduzidas em palavras de alto poder destrutivo e catalisador. Extravasam sentimentos e ressentimentos, ofensas, mágoas, enumeram dores e traições até chegarem a um estado de delírio, como se estivessem na beira de um abismo, realidade e sonho, amor e desamor.
Para mim, que não mais vejo o filme mas que de vez em quando releio o livro, ficaram os gestos, o casal, a casa, a modernidade, a contemporaneidade e a beleza dos diálogos de amor.
“ – Ouve!!! Se não, morre... Eu me apaixonei por outro homem porque você não me emocionava mais.” (pág 107)
“ – Será que nunca mais vou te esquecer? Será que nunca mais vou olhar para um espelho sem ver você refletida? Será que nunca mais vai chover sem eu ver a chuva molhando teu rosto?” (pág 109)
É isso.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Shopping Barra - Lounge em frente às Lojas Americanas
Data: 26/05/2012
domingo, 22 de abril de 2012
PÉROLA
Depois da euforia por completar dois anos de escritas no blog estou de volta ao exercício de abandonar livros por aí e aproveito para inaugurar uma nova série. E desta vez farei o caminho inverso. Sempre considerei como personagem principal ‘o livro’, que, às vezes, devido ao sucesso acaba adaptado para outras praias, ou outras mídias como os modernos gostam de dizer. Desta vez trarei uma série de resenhas sobre livros que nasceram de outras vertentes, mas que foram imortalizar-se nas páginas seguras de uma edição literária.
Pérola é uma obra prima do grande Mauro Rasi (1949-2003), nasceu texto para o teatro e teve sua primeira temporada iniciada no Teatro Leblon dia 24 de março de 1995. Vera Holtz, Sergio Mamberti, Emilio de Mello formam o trio principal: Mãe, Pai e Filho, retirados do núcleo familiar do autor e retratados de forma teatral, sensível, delirante, despertando no expectador a forma de partilhar pequenos sentimentos, aqueles que nos chegam individualmente. Essa família de Bauru no interior de São Paulo se traduz em qualquer família, de qualquer cidade, com suas emoções corriqueiras, conversas na cozinha, sonhos de status traduzidos na construção de uma piscina no quintal para reencarnar a Ester Williams interiorana das telas do cinema.
Quando assisti ao espetáculo na sua temporada paulistana o que mais ouvi depois do final grandiloquente foi a frase; “igualzinho a minha família”. Prova do sucesso da peça, prova da qualidade do texto de Mauro e da direção tão acertada que ele fez do próprio texto. Mauro Rasi tinha a consciência e a vivência dos fatos, ele sempre afirmava que “saí de Bauru, mas Bauru nunca saiu de mim”.
A peça ficou cinco anos em cartaz e viajou pelas principais cidades, eu tive a sorte de assistir duas vezes, ri muito com as peripécias e Pérola e me emocionei junto com ela a cada conquista. Família é assim, em qualquer lugar, em qualquer endereço, briga, faz as pazes, comemora, chora e segue cheia de histórias. Vale a pena o resgate do texto, até mesmo para quem não sentou na cadeira do teatro e esperou pelo terceiro sinal.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Associação Atlética da Bahia
Data: 06/05/2012
Pérola é uma obra prima do grande Mauro Rasi (1949-2003), nasceu texto para o teatro e teve sua primeira temporada iniciada no Teatro Leblon dia 24 de março de 1995. Vera Holtz, Sergio Mamberti, Emilio de Mello formam o trio principal: Mãe, Pai e Filho, retirados do núcleo familiar do autor e retratados de forma teatral, sensível, delirante, despertando no expectador a forma de partilhar pequenos sentimentos, aqueles que nos chegam individualmente. Essa família de Bauru no interior de São Paulo se traduz em qualquer família, de qualquer cidade, com suas emoções corriqueiras, conversas na cozinha, sonhos de status traduzidos na construção de uma piscina no quintal para reencarnar a Ester Williams interiorana das telas do cinema.
Quando assisti ao espetáculo na sua temporada paulistana o que mais ouvi depois do final grandiloquente foi a frase; “igualzinho a minha família”. Prova do sucesso da peça, prova da qualidade do texto de Mauro e da direção tão acertada que ele fez do próprio texto. Mauro Rasi tinha a consciência e a vivência dos fatos, ele sempre afirmava que “saí de Bauru, mas Bauru nunca saiu de mim”.
A peça ficou cinco anos em cartaz e viajou pelas principais cidades, eu tive a sorte de assistir duas vezes, ri muito com as peripécias e Pérola e me emocionei junto com ela a cada conquista. Família é assim, em qualquer lugar, em qualquer endereço, briga, faz as pazes, comemora, chora e segue cheia de histórias. Vale a pena o resgate do texto, até mesmo para quem não sentou na cadeira do teatro e esperou pelo terceiro sinal.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Associação Atlética da Bahia
Data: 06/05/2012
terça-feira, 17 de abril de 2012
ANO DOIS
Dois anos de blog. Estou emocionado ao escrever e espero chegar ao fim sem parecer piegas. Relendo o post de Um Ano, publicado no dia 17 de abril de 2011, me dei conta de quanto crescemos, não só em número de post escritos, até hoje 86 resenhas, 4.500 visitas, um aumento expressivo já que em 2011 eu estava comemorando 1.000 visitantes, e achando isso o máximo. Além do número de seguidores visíveis que pulou de 25 para 41.
Durante esse tempo ouvi os mais diversos comentários sobre o blog. Recentemente um amigo, Lelo Filho, me fez a seguinte pergunta: Você está se desfazendo da sua biblioteca? Ao responder a ele percebi que essa é a pergunta mais frequente, e o ‘desfazer-se’ tem um peso grande na opinião que as pessoas tem sobre o blog. Uns dizem que sou maluco, outros acham que estou praticando o desapego, e a grande maioria não entende a motivação, que, na verdade, é muito simples - ao abandonar livros estou abrindo espaço. Na décima vez que respondi isso eu percebi o quanto é importante abrir espaços na vida, seja para novos livros, novos amigos, discos, lugares e, principalmente, novas maneiras de encarar a vida e o que ela nos oferece.
Abrir espaço para novos livros e fazer circular aqueles que já li é compartilhar conhecimento com alguém que não espera por isso. É essa a lição que aprendi. Quando abandonei o livro ‘A Última Música’ na balaustrada da praia da Pituba, atravessei a rua e pela primeira vez fiquei dentro do carro esperando para ver o que acontecia. Depois de várias pessoas passarem pelo livro ignorando-o completamente, um casal veio andando devagar, ela olhou o livro e comentou algo com ele, que olhou para os lados e não achou o provável dono, ela se antecipou e pegou o livro, olhou a capa e imediatamente abraçou o livro. Não sei se pela capa, que contém a foto do casal de atores do filme, ou se pelo exemplar em si. Ele tomou o livro da mão dela e colocou de novo no lugar, eu não consegui saber o eles conversavam, ela foi lá e pegou o livro novamente, desta vez o abriu e deu de cara com o texto explicativo do blog, leu, sorriu e mostrou a ele, que também o leu. Ela sorriu, ele também, ela abraçou o livro, deu a mão para ele e os dois continuaram a caminhada. Eu, dentro do carro, chorei de emoção.
Achei que ela fosse escrever um comentário no blog, esperei por dias a fio mas depois percebi que mais importante que um comentário, ou uma visita ao blog, foi o fato de ter proporcionado ao casal aquele momento único, seja lá porque o motivo. Quando vejo na televisão ou no jornal uma reportagem ou foto de um jurista, ou médico, professor, político, eles sempre fazem a entrevista/foto na frente de uma estante, isso vale também para aqueles que querem projetar certa erudição, ou mais confiança em quem o assiste ou lê. Sempre penso se aquela pessoa realmente leu todos aqueles livros, ou foi o arquiteto/decorador que entrou numa livraria ou sebo e montou essa estante na casa do cliente. Sinto realmente uma pena enorme porque acho que qualquer livro merece ser lido, pelo menos uma vez.
Momento agradecimento, não pode faltar, então: agradeço aos meus amigos fiéis, leitores visíveis ou não, aqueles que comentam o blog e mandam sugestões por e-mail. Continuo aqui, enquanto houver livros para ler e eu tiver inspiração para escrever. Obrigado, de verdade.
Na foto: Um cupcake delicioso dos amigos do blog Meu Vilarejo.
domingo, 15 de abril de 2012
O DIABO VESTE PRADA
O emprego deveria ser o sonho de todas as garotas antenadas em moda e o mundo fashion: ser assistente de Miranda Priestly, editora da revista Runway Magazine, temida pela sua austeridade e gênio forte, além disso, famosa pelo seu gosto apuradíssimo, capaz de erguer ou destruir uma carreira com um simples gesto facial. Por coincidência ou não a autora Lauren Weisberger (1977) trabalhou com a lendária Anna Wintour, editora da revista Vogue americana. Coincidências à parte, o romance é tendencioso e quase autobiográfico. A própria também não era flor que se cheirasse, lendo o livro percebe-se o rancor e a desfaçatez da personagem que cuspia no café antes de servir a chefe por achar-se muito acima de tarefa tão pequena. O livro, por vezes engraçado, é muito rancoroso e até chato, tamanha a quantidade de lamurias da personagem principal.
Esse é um raríssimo exemplo de adaptação primorosa de um livro para as telas de cinema. Na verdade, o roteiro cinematográfico apenas inspira-se no livro, o argumento da garota interiorana e inteligente que arranja um emprego na revista de moda do momento e a partir daí começa o efeito Pigmaleão. A transformação da garota inocente numa bela mulher, refinada, e capaz de atender as mais absurdas solicitações da chefe. Neste momento cabe ressaltar a escolha do elenco principal: Meryl Strrep (Midanda), Anne Hathaway (Andrea), Emily Blunt (Emily) e Stanley Tucci (Nigel), dão um show de carisma e interpretação, o figurino é quase um personagem à parte e a trilha sonora foi campeã de dowloads.
Confesso aqui que li o livro uma única vez, mas já assisti ao filme pelo menos umas dez vezes. Comigo tem um efeito tal qual um imã, toda vez que estou zapeando pelos canais de TV e me deparo com o filme, esteja em que momento for, paro tudo e continuo assistindo até o fim. Existem cenas lendárias que o diretor gravou em minha memória: a sucessão de casacos e bolsas que Miranda joga na mesa de Andrea, a explicação de Miranda sobre o cinto azul, o momento que Nigel leva Andrea para o closet da Runway e, logo a seguir, a sequência de figurinos que a personagem desfila pelas ruas de Nova York ao som de Madonna, e, por fim, toda a etapa Paris e os desfiles.
Leia o livro por curiosidade e veja o filme muitas vezes. Não é só frivolidade, é cultura!
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Perini - Lanchonete - Graça
Data: 05/05/2012
sexta-feira, 6 de abril de 2012
O BEIJO DA MULHER ARANHA
O escritor Ignácio de Loyola Brandão disse sobre O Beijo da Mulher Aranha: "Numa cela, dois presos. Um, político, heterossexual convicto. O outro, um homossexual, acusado de corrupção de menores. O que se pode fazer na solidão de uma cela que fede, o heterossexual está com os intestinos soltos, senão conversar o tempo inteiro? Falar da vida, da realidade, das coisas que aconteceram em suas vidas. E quando não há vida, ou ela é brutal demais, é necessário reinventá-la... E de repente, do meio da imundície daquela cela, da solidão de dois homens diferentes, mas ligados pelo que tem de humano, ambos vítimas da mesma violência de um regime, surge um quadro terrível de um sistema político social. Um livro político que não é chato, nem estereotipado, nem panfletário. Surpreende a cada passo." É uma boa descrição, uma boa orelha de livro, mas falta falar da fantasia, sim, é a fantasia que move o livro. Mesmo com todos os adendos e explicações de rodapé, é a inexistência do narrador e os diálogos bem construídos entre os personagens que torna toda a história sutil e apaixonante. Como bem o disse Ignácio, Manuel Puig (1932-1990) nos brinda com um livro surpreendente a cada “página”.
Molina e Valentín são dois homens acuados, suas sexualidades e disparidades no modo de encarar a vida são desvendadas logo no início e, entre eles, há uma pressão partidária. Valentín cobra de Molina o engajamento com a realidade e a crueza do regime político em que vivem. Molina cobra de Valentín a possibilidade de viver com leveza e para isso reinventa filmes e histórias com a finalidade de entreter nos momentos de dor. Cada um recebe do outro o que o outro tem de melhor e despem-se de preconceitos, traições e violências.
Adaptado para o cinema em 1985, o filme foi dirigido por Hector Babenco com um elenco estrelar: Raúl Juliá (Valentín), William Hurt (Molina) e Sônia Braga (Leni Lamaison/Marta/Mulher Aranha). Produzido com baixos custos o filme arrecadou dezessete vezes mais que o valor gasto. Sônia Braga na fase belíssima sofreu para dizer suas falas, ela ainda não dominava o inglês e foi necessário decorar foneticamente palavras e frases, perdendo, na minha humilde opinião, a expressão natural de atriz.
O ator Burt Lancaster iria fazer o papel de Molina mas foi impedido por um problema cardíaco, Raúl então sugeriu o amigo William Hurt e este interpretou magistralmente o afeminadíssimo Molina arrebatando o Oscar de Melhor Ator em 1985. O filme marcou a história dos prêmios Oscar: Hurt foi o primeiro a receber a estatueta de Melhor Ator por interpretar um personagem abertamente homossexual, e O Beijo da Mulher Aranha foi o primeiro filme independente da história a ser indicado ao prêmio de melhor filme.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Restaurante Suan Lon
Data: 29/04/2012
domingo, 1 de abril de 2012
A COR PÚRPURA
A Cor Púrpura é o quinto livro publicado da escritora Alice Walker (1944). Foi através do relato da vida de Celie que Alice obteve fama mundial e ganhou o prêmio Pulitzer em 1983, um ano após o lançamento do livro.
Celie escreve cartas, primeiro para Deus, depois para sua irmã Nettie, contando sua história desde que tinha quatorze anos e era violentada pelo pai. E vai narrando o nascimento dos seus dois filhos, a separação dos filhos e da sua irmã imposta pelo pai, o seu casamento arranjado com Sinhô, homem bruto que a trata mais como escrava do que como mulher. Sinhô era apaixonado por Shug Avery, uma cantora de blues que já tinha sido sua amante, e é justamente esta mulher que terá grande influência na vida de Celie. A princípio elas se estranham, mas logo Shug descobre a doçura por trás daqueles olhos baixos e subservientes. É a partir da amizade das duas que Celie inicia a trajetória pela conquista da sua autoestima.
Pode-se não perceber a princípio, mas o livro tem uma carga enorme, um pano de fundo para tratar de assuntos como racismo, machismo, patriarcado, opressão, amizade, amor, desamor, carências emocionais, entre outras coisas.
Whoopi Goldberg apareceu gloriosa no papel de Celie. O filme dirigido por Steven Spielberg transformou-se num um rio de lágrimas que inundou os cinemas do mundo em 1985, e até Oprah Winfrey viveu seus dias de atriz na pele da personagem Sofia. Em 1986 o filme recebeu onze indicações ao Oscar nas principais categorias; melhor filme, atriz (Woopi Goldberg), atriz coadjuvante (Oprah Winfrey e Margareth Avery), direção de arte, fotografia, figurino, maquiagem, trilha sonora, roteiro adaptado e canção original, a até hoje cantada e cultuada Miss Celie’s Blues. Não ganhou nenhum.
É..., a Academia é imprevisível.
Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Mercado do Peixe - Rio Vermelho
Data: 15/04/2012
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